sexta-feira, 20 de setembro de 2013

TERROR E CORRIDA



Um abrir de porta gera um acorde, uma noite de chuva exibe trovões contínuos que a sonoplastia agiganta dentro da sequencia, os espíritos maus exibem caras de cadáveres em decomposição, e o vilão demoníaco deixa o cenário dos heróis para ir, explicitamente, ao diabo que o carregue. Por mais que o artesanato de James Wan exiba um certo equilíbrio no modo como conta a sua historia, “Invocação do Mal”(The Conjuning) é a velha formula de assustar os assustáveis em sala de cinema. Há quem goste do que se chama “filme de terror” e em especial os namorados que aproveitam a incitação ao medo para uns amassos. O cinéfilo ri. E se o faz se diverte.É o mínimo. Melhor como diversão é ver as corridas de “Rush” o filme de Ron Howard sobre a rivalidade de Nick Lauda e James Hunt pilotos de Formula Um que maçaram o esporte nos anos 70. O filme cobre principalmente o ano de 1976 quando as corridas ganharam espaço em muitos países com muito interesse (e dinheiro). Os dois atores que fazem respectivamente Lauda e Hunt, Daniel Bruhl e Chris Hemsworth, dão conta do recado. O diretor usa de sequencias reais numa boa montagem com os rapazes nos volantes. Eu que não sou muito desse tipo de peleja não olhei para meu relógio durante a projeção. Valeu. Em casa vejo o mais recente filme de Sofia Coppola:”Bling Ring”. Sobre “filhinhos de mamãe” que roubam casas de artistas de Hollywood. Fica engraçado quando eles entram no palacete da atriz Lindsay Lohan que havia sido presa. E a garotada até que escapa de penas grandes. Bem narrado, o filme pinta uma realidade dolorosa ao ver os jovens se drogando sem perspectivas na vida que levam. É o outro lado da terra da fantasia. (Pedro Veriano)



"CINE HOLIÚDI"

Em 2004 o cearense Halder Gomes realizou o curta-metragem “Cine Holiúdy – o Astista Contra o Caba do Mal”, ganhando mais de 40 prêmios em mostras especificas. Ano passado obteve recursos para avançar sua idéia num longametragem de sua história. E surgiu este “Cine Holiudy”(2013) que por um verdadeiro milagre de mercado atinge o território nacional com uma simultaneidade entre blockbuster. O filme foi realizado numa cidade do interior do Ceará, com orçamento baixo (diga-se baixíssimo) e um artesanato amadorístico. Interessava captar o regionalismo como a fórmula de comédia. E para isso foi usada a “fala nordestina”. Tanta gíria que houve necessidade de colocar legendas nas cópias nacionais. O enredo segue o interiorano Francisglaydisson que sonha em montar um cinema mesmo com a ressalva da esposa que lembra sempre seus deveres de família (ela e um filho menor). Seguindo o sonho, ele deixa seu vilarejo e segue para um município onde (décade 70) ainda não tinha chegado televisão. E o perigo da TV já era notado na sua terra de origem onde se vê um garoto contando as peripécias que vê de um aparelho Telefunken (marca popular na época). Ao chegar à localidade onde deve se assentar, o rapaz acha um prédio abandonado e monta o seu cinema. Há muita burocracia a enfrentar e isso é motivo de critica. Mas finalmente ocorre uma sessão de estreia com a presença do prefeito, do pároco, de funcionários públicos e o mais de um microcosmo onde pontuam tipos populares exibidos com a mais rude caricatura possível para efeito cômico. O projetor 16 mm não termina o programa (queima) e quem faz a vez dos lutadores de caratê do filme em exibição é o próprio dono da casa, contentando a plateia, sob as sombras mágicas da tela do cinema. No fim de tudo, chega à praça a primeira imagem televisiva. Mas Francisglaydisson acaba fazendo parte da nova tecnologia. Se o espectador for levar a coisa a sério, ou pensar em comédia de estilo universal, vai achar um absurdo o “cearês” aventado por Gomes. É preciso levar em conta as peculiaridades regionais que o cineasta usa como fórmula de seu trabalho. Para isso há um padre estereotipado como palhaço de circo, como há agentes de segurança que parecem lutadores de ringue, e um político (o prefeito) usando e abusando da demagogia inserida anos a fio no anedotário popular. E entre a garotada que tenta assistir ao filme da rua, forçando uma janela, há um palhaço. O roteiro poderia caber num circo mambembe desses que percorrem cidades interioranas do Brasil como Selton Mello mostrou no seu “O Palhaço”. Influências existem. Do “Cinema Paradiso” de Giuseppe Tornatore, do “Splendor” de Ettore Scola, do “Bye Bye Brazil” de Cacá Diegues. Mas esses filmes são apenas lembranças esparças aproveitadas certamente pelo diretor cearense. “Cine Holiúdy” é um glossário de ditos folclóricos, de comicidade popular que se expressa especialmente nas falas. Termos peculiares da região saltam como meios de articular os diversos tipos, todos mostrados de relance, sem qualquer profundidade, objetivando unicamente o riso, especialmente de quem conhece o palco das palhaçadas. Vi o filme como um raro exemplo de cinema modesto, especificamente regional, semiamadorista, e, por causa disso, dono de uma sinceridade incomum. É um diamante bruto a ser lapidado mais pela capacidade da plateia auferir como é um pedaço do Brasil. Acima de tudo, uma maneira de extrair o nosso típico modo de viver essa arte visual como a que foi implantada pelo cinema de Hollywood criando a cultura dos filmes “capa e espada” e/ ou dos karatês. Um exemplo é o momento que a “lanterna mágica” se desloca da pelicula que havia queimado na cabine e vê a ginástica de lutador do dono do cinema. Esse é um dos bons momentos do filme, pois mostra que essa arte enquanto ilusão não está derrotada porque as sombras mágicas reconstituem o desejo de ver o que todos têm na imaginação. Senti no filme uma postura responsável de quem gosta de cinema e que um dia passou por essa situação em sua cidade. Se amadoristico, garanto que representa bem o que é ser criativo. Merece meu aplauso. (Luzia Álvares)

"O ATAQUE"

Roland Emmerich é um cineasta alemão radicado em Hollywood que se especializou em “disaster movie”, ou seja, filmes sobre cataclismos que impressionam pela grandiosidade aparente do processo de produção. O seu primeiro trabalho exibido em Belém, no Cine Líbero Luxardo dos primeiros anos, já se posicionava nesse gênero: “O Principio da Arca de Noé”(Das Arche Noah Pinzipe, Alemanha, 1984). Ali uma estação espacial fazia a guerra entre nações, a lembrar do que o presidente norte-americano Ronald Reagan propunha, como seja a destruição de armas inimigas através de engenhos colocados na orbita da Terra(o programa chamado na época de “guerra nas estrelas”). Logo embarcando para os EUA, Emmerich se notabilizaria por filmes como “Independence Day”(1996), “Godzilla”(1998), “O Dia Depois de Amanhã”(2004), “10.000 AC”(2008) e “2012”(2009). Só em 2011 tentaria mudar de gênero com “Anônimo”(Anonimus) a historia de um nobre da corte a rainha da Inglaterra, Elizabeth I, que teria escrito as peças assinadas por William Shakespeare. Um bom filme que por aqui só chegou em cópia DVD e nos canais de TV por assinatura. Agora Emmerich apresenta “O Ataque” (The White House Down) onde expõe uma invasão na Casa Branca, em Washington, com o presidente dos EUA mantido refém de um de seus assessores guinado a mentor de um golpe pretensamente por vingança de ter perdido o filho em guerra no Oriente Médio. O roteiro de James Vanderbilt (o mesmo de “Zodiaco”, de David Fincher), lembra o recente “Invasão à Casa Branca”(Olympus Has Fallen, 2011) de Antoine Fuqua. A diferença, numa leitura superficial, é de que o presidente de “Ataque”, representado por Jamie Foxx, é mais valente, conseguindo derrubar alguns adversários. Mas o que ressalta o novo filme são dois fatores: primeiramente as inclusões de bom humor que não são muito comuns em histórias de catástrofes (mesmo filmadas por Emmerich). Depois, a motivação política do enredo. Não é bem o fato de o fomentador da rebelião ser um pai amargurado pela morte do filho e, além disso, ser um homem condenado por um tumor maligno no cérebro (papel ingrato para o veterano James Woods). Na verdade há uma resposta à negação de apoio à indústria bélica. É possivel pensar, então, que muitas campanhas belicosas dos EUA (e de outras nações do chamado primeiro mundo) derivam do protecionismo que o governo devota aos fabricantes de armas. Fica evidente o que alguns historiadores afirmam que um dos meios usados por Roosevelt para combater a crise econômica iniciada em 1929 foi impulsionar a indústria bélica, fato que serviria para quando os EUA resolveu entrar na 2ª Guerra Mundial. O filme de Roland Emmerich tem essas brechas curiosas. Para o espectador é mais divertido ver as peripécias de Cale (Channing Tatum) candidato preterido a assessor do presidente, lembrando os superherois da Marvel no modo como escapa de balas e explosões, pulando de alturas enormes e ainda conseguindo subverter armadilhas inimigas para chegar perto de sua filha menor, Emily (Joey King), no fim das contas a heroína que posta no youtube cenas da invasão com as imagens dos revoltosos, como consegue evitar que aconteça uma guerra nuclear acenando uma bandeira para que os aviões, convocados por um mecanismo que só o presidente tem acesso mas, no caso, foi monitorado por outro, abortem a operação de bombardeio. Essa capa de aventura & ação pode ocultar a critica política do roteiro original, mas o contraste do que se vê no inicio como as dependências faraônicas da Casa Branca e, afinal, a vulnerabilidade que se estende ali e ao mundo resta como o tempero que torna tolerável o espetáculo. “O Ataque” não deixa de fora a representação que se faz dos terroristas islâmicos nessa peça de aventura cinematográfica, embora o terrorismo apresentado seja dos próprios compatriotas do presidente dos EUA travestidos de seguranças particulares dele. E esse ponto no filme nem é tão evidente para o espectador que só deixa de lado as referências discriminatórias quando as imagens postadas no youtube revelam a identidade do bando. Dessa forma, o fato do ataque se tornar um evento possivel de ocorrer naquelas bandas não deixa de fora a sinalização da ku-klux-kan, seita terrorista que não vê com bons olhos a presença de um negro na cadeira política nº 1 daquele país. Embora seja descartável, o filme de Emmerich colabora com idéias para se pensar essas situações e demonstrar a falibilidade de seguranças aos personagens da atual história política norteamericana. Informo que tive minha dose de riso desse filme. (Luzia Álvares)

A DIFICULDADE DO ENCONTRO EM "A VISITANTE FRANCESA"




O roteiro de um filme é sempre uma tentativa, consciente ou não do autor, de sistematizar, cena por cena, a solução dos problemas técnicos e artísticos para a realização de um filme, antes e durante as filmagens. Em “A Visitante Francesa”, em cartaz até o final do mês no Cine Estação das Docas, o diretor sul-coreano de Hong Sang-soo (que também assina o roteiro) se utiliza da metatextualidade, numa relação de diálogo entre a escrita de um roteiro para cinema e o filme que se apresenta na tela, juntamente com a inclusão poética da própria narradora. Personagens e objetos que estão nas três histórias se inserem no tempo narrativo que experimenta, por meio de variações e repetições, a condução de histórias (como contos) escritas pela jovem Yonju, em pequenos textos escritos inicialmente para evitar o tédio e a ansiedade no aguardo de resoluções para problemas familiares. A dificuldade do encontro e as aproximações tímidas e desastradas que abrem e fecham as possibilidades de comunicação (tema explorado tanto pela Nouvelle Vague como pelo cinema de Michelangelo Antonioni), convidam o espectador a se afastar, nem que seja por 90 minutos, do olhar viciado em padrões da narrativa clássica que repetem estruturas já consagradas do ponto de vista da recepção estética. “A Visitante Francesa” aposta no cinema de experimentação, o que não quer dizer necessariamente inovação, pois o mérito maior do filme reside justamente na recriação de procedimentos que contam histórias em imagens. Novas situações em um mesmo cenário e os mesmos objetos dispostos em contextos diferentes fazem a marcação deste jogo intersemiótico, em que a garrafa quebrada, a barraca de camping, o guarda-chuva e o farol são elementos que se encontram devidamente enquadrados para reinventar outros caminhos narrativos, tais como: uma diretora de cinema a passar as férias na praia, uma mulher casada que vai encontrar o amante, e uma mulher divorciada, esta última a fechar o filme de forma instigante. O formato episódico com três histórias (como curtas), provoca o cinéfilo pela ordem e desordem do espaço fílmico, em que o diretor se vale do uso de elipses que desafiam nossa percepção, como na busca de um farol localizado num pequeno balneário e o que esta busca, de fato, representa. A aparição de um salva-vidas surge como um aceno, um sinal, que como os ensinamentos budistas do terceiro episódio, não respondem nada com a exatidão tão esperada. O farol, o salva-vidas e o monge budista são ineficazes para respostas prontas e frases de alívio. Se no primeiro episódio, a incomunicabilidade se impõe, de forma a afastar qualquer possibilidade de encontro; no segundo (podemos induzir), o encontro pode não acontecer naquele determinado momento e pode ser adiado; enquanto no terceiro, um encontro mais próximo finalmente se realiza, sem garantias de prolongamento e soluções finais estáveis. “A Visitante Francesa” é um filme sobre cinema, sobre a escrita de um roteiro que vai além dos movimentos descritivos que acontecem em frente à câmera. Além dos efeitos à exaustão do cinema contemporâneo, das simples indicações de gruas, iluminação, diálogos, entre outros procedimentos. (José Augusto Pacheco)

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