sábado, 29 de outubro de 2011

FILME DE ARTES MARCIAS COM UM TOQUE DE SENSIBILIDADE


Filme de Artes Marciais com um toque de sensibilidade
Em “Cinzas do Passado”, o diretor Wong Kar Wai quebra paradigmas do gênero.

Um homem obcecado por contar histórias de desilusões amorosas, sonhos destruídos, retratar a incompletude das pessoas. Esse homem, um cineasta nascido na província de Hong Kong, que foi devolvida à China, tem uma sensibilidade e gostos peculiares: fala de aspectos da sociedade de seu país unindo efeitos sofisticados de câmera e luz, a trilhas sonoras que trazem de tangos a Nat King Cole. Ele, o esteta do cinema Wong Kar Wai, resolve, em 1994, adentrar no universo dos filmes de artes marciais, e o resultado poderá ser conferido pela primeira vez pelo público paraense, na sessão que a ACCPA promove nesta segunda, no IAP.
A versão que será apresentada será “Cinzas do Passado – Redux”, lançada nos cinemas mundiais em 2008 trazendo novos cortes e uma cena adicional, a critério do próprio Wong Kar Wai. Esse filme foi realizado bem antes da febre mundial encabeçada por “O Tigre e o Dragão”, que colocou o gênero de arte marcial no primeiro escalão da indústria cinematográfica mundial, seguido pelos grandes sucessos “Herói” e “O Clã das Adagas Voadoras”, ambos de Zhang Yimou.
Diferente desses filmes, que salvo algumas cenas onde a mis-em-scene gera momentos interessantes, o apelo visual é mais forte do que o aspecto narrativo. E por isso “Cinzas do Passado” causa bastante estranhamento, pois inova esteticamente ao retratar o universo mítico aonde os Wuxia (filmes de artes marciais que são épicos de cavalaria) se passam, um tempo suspenso no fluxo temporal, de forma fragmentada, abusando dos efeitos slow e flashbacks.
O enredo acompanha a saga do reflexivo espadachim Ouyang Feng (Leslie Cheung), que se sustenta contratando assassinos de aluguel e lhes dando trabalhos. Ele está solitário, o que tem muito a ver com o fato de seu coração há muito ter sido ferido por um amor que ele negligenciou e perdeu. Uma das pessoas que atravessa seu caminho é Huang Yaoshi (Tony Leung Ka Fai), que lhe presenteia com um vinho mágico que apaga memórias de quem o bebe. Eles entram em conflito e o que se vê a partir desse ‘dispositivo’ – um momento que desencadeia uma virada na trama – é o tempo psicológico dominar o filme, com Ouyang atravessando o deserto de Gori sendo consumido pelo seu passado.

Personagens densos
Com o passar das cinco estações do ano – segundo o calendário chinês -, ele, vai encontrando mais amigos e alguns inimigos. Ciníco e impiedoso, Feng guarda rancor do irmão, que acabou se casando com a mulher que amava (Maggie Cheung). Ele conhece Murong Yin/Murong Yang (Brigitte Lin), uma mulher que quer ter o seu amor. A personagem de Lin tem nuances muito intensas, pois ao contratar Ouyang para matar seu irmão ela é simplória, e vai modificando a sua personalidade acompanhando a forma como a história se desencadeia – daí o fato de ter dois nomes na trama, Yin e Yang, o bem e o mal na filosofia chinesa, ou a dualidade existente em cada um de nós.
Tony Leung Chiu Wai também se destaca como o espadachim quase cego, que gera um revés na saga de Ouyang, numa cena de luta cadenciada, espaçada e compartilhada por ambos num nível ‘espiritual’. O filme traça um panorama poético entre a relação homem, filosofia, ética e a sua própria natureza, através de projeções de luz e bailados que são alegorias para as desilusões amorosas resolvidas na ponta da espada – mesmo que as lutas aqui sejam esparsas.
A versão Redux é um alento para quem admira Wong Kar Wai por obras como “Amores Expressos”, “Amor a Flor da Pele” e “Felizes Juntos” como para aqueles que desejam ver um típico filme wuxia pré-pasteurização advinda de tamanha popularização, que foge das convenções ao contar uma história de amor e perda, entrecortada por cenas de kung fu espiritual.

(Lorenna Montenegro)

SERVIÇO:
Sessão ACCPA/IAP apresenta “Cinzas do Passado”. Nesta segunda, dia 31, às 19h no Cineclube Alexandrino Moreira.
Local: Auditório do IAP (Praça Justo Chermont, 236 – Nazaré).
Inadequado para menores de 12 anos.
Entrada Franca.

Após a exibição, debate com membros da Associação de Críticos do Pará e o público.

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