sexta-feira, 10 de maio de 2013

"NO"

A importância de não estar de acordo O publicitário René Saavedra (Gael García Bernal) sabe exatamente o discurso para vender bem uma campanha. Ele começa sempre dizendo “O que vocês vão ver pode parecer diferente, mas acredito que o Chile esteja preparado para as mudanças e o que elas trazem de moderno”. René, então, mostra o comercial para o lançamento de um novo refrigerante. O estranhamento ocorre porque no meio do jingle alegre e das imagens vibrantes aparece um mímico. O cliente reclama: “Por que um mímico no meu comercial?”. René sorri e recomeça a sessão de convencimento. A ação se passa no Chile de 1988 e o general Augusto Pinochet, em face à forte pressão da opinião internacional, decidiu que o Chile deve passar por um plebiscito que irá escolher se ele fica no poder ou não. Pinochet estava no poder desde 1973, quando um golpe de estado, liderado por ele, derrubou o governo de Salvador Allende. Agora, o povo chileno poderá escolher sim ou não.
O filme “No”, direção de Pablo Larraín, em cartaz no Cine Líbero Luxardo, do Centur, dias 2 e 3 de maio, às 21h, e 4 e 5, às 16h30, com ingressos a R$ 8,00 (e meia entrada), mostra como René, a princípio arredio à ideia, aceita fazer a campanha do “não”. A produção foi indicada a Melhor Filme Estrangeiro em 2013, representando o Chile, mas perdeu a estatueta para “Amor”, de Michael Haneke. Exílio - René havia sofrido na pele a pressão política do golpe militar de Pinochet. Seu pai fora perseguido e a família dele teve que exilar-se. Mas René voltou a Santiago e a única coisa que quer é trabalhar, cuidar do filho de 9 anos e tentar entender como a ex-mulher dele ainda continua envolvida com a militância política e, volta e meia, está presa. Tudo o que René não quer é se envolver com política seja de direita ou esquerda. Mas depois de não atender aos muitos telefonemas de José Tomás Urrutia (Luis Gnecco), o líder dos partidos que fazem oposição a Pinochet, René não pode deixar de atendê-lo quando Urrutia o procura na agência de publicidade. E a proposta de Urrutia é simples: quer a assessoria de René para a campanha do “não”. René se nega, mas não deixa de dar uma olhada no material já pronto. E o que vê, René não gosta. A campanha é cheia de ressentimentos e evoca as vítimas da ditadura de Pinochet. É cheia daquilo do que hoje se convenciona chamar nas redes sociais de mi mi mi. Ainda relutante, René faz uma proposta de campanha, e quem estranha são os integrantes dos partidos, afinal a proposta é de alegria, pra cima e um pouco do clipe “We are the world”. Afinal, o que René quer com aquilo tudo? E as pessoas que desapareceram, que foram mortas, torturadas? Aí entra a sessão de convencimento a qual todo publicitário saber de trás pra frente. Na verdade, a oposição acredita que a campanha do plebiscito é apenas “para inglês ver”, que o governo Pinochet já está com a eleição ganha. E assim também pensa a situação. Mas as surpresas estão apenas começando. Vibrante - Quando a campanha começa na televisão, com 15 minutos para o sim e o não, o que se vê na campanha do “não” é alegria e esperança de que dias melhores chegarão ao Chile. “Chile, a alegria está chegando”, diz o jingle principal da campanha. E apesar da pouca esperança, a semente foi lançada e a campanha “não” começa a incomodar. René passa a ser vigiado. O muro de sua casa aparece pichado. Telefonemas na madrugada perguntam pelo filho dele. Ameaças veladas partem de todos os lados, inclusive do patrão dele, Lucho Guzmán (Alfredo Castro). Mas a campanha continua. Lucho passa assessorar o “sim” e como conhece o trabalho de René começa um início de reação à bem bolada campanha de seu empregado, reforçando as conquistas econômicas do Chile nos 15 anos de governo Pinochet. Reação um tanto tardia.
O roteiro de “No” partiu de uma peça inédita de Antonio Skármeta, "El Plebiscito", mas também dependeu muito de pesquisas adicionais e entrevistas com as pessoas que viveram aqueles dias. Uma grande sacada do filme é a fotografia que remete diretamente aos filmes em 16 mm e até 8 mm, bem comuns à época, com a cor em sépia e o quadro reduzido. O filme se comporta como se fosse um documentário. Para quem ainda lembra que o Brasil passou por uma longa (e terrível) ditadura, “No” toca em pontos doloridos que ainda incomodam. O Chile pós-plebiscito se mostrou corajoso e se lançou, sim, num novo momento político, onde a truculência da polícia e as perseguições políticas não tinham mais vez. “No” mostra isso com maestria e, alguns momentos, carregados na emoção. Um belo filme que merece ser visto.
Dedé Mesquita

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