domingo, 3 de novembro de 2013

"FERRUGEM E OSSO"

Adaptando o conto do canadense Craig Davidson, o cineasta francês Jacques Audiard aborda, no seu filme “Ferrugem e Osso”(De Rouile et Os, França, 2012) a história de Ali (Matthias Schoenaerts) um boxeador desempregado que precisa brigar em lutas clandestinas para sobreviver após uma lesão. Ele vai da Bélgica para a França hospedando-se na casa de sua irmã e procurando dias melhores para o filho de pouca idade. Quando conhece, em uma briga de bar, a jovem Stephanie (Marion Cottilard), funcionária de um aquário público, a situação ganha um novo caminho. Nasce um romance, mas a jovem que treina orcas sofre um acidente dentro do aquário, tendo as duas pernas devoradas pelo animal. Daí em diante, o pugilista belga ao invés de diminuir seus encargos acha outro: há de cuidar de si, do filho e da namorada. “Ferrugem e Osso”(De Rouile et Os, França,2012) é um filme do diretor de “O Profeta” (2009), Jacques Audiard, vencedor de 21 prêmios e recebendo 33 indicações em mostras internacionais de cinema. Marion Cottilard, ganhadora do Oscar por “Piaf” (2007) chegou a ser indicada ao Globo de Ouro pela personagem. É de supor que o resultado do trabalho tenha sido demasiadamente aplaudido. Além dos bons desempenhos da dupla principal há pouco a se ressaltar na odisseia dos personagens. Impressiona, sim, o efeito especial utilizado para mostrar as consequencias do acidente da jovem atacada pela orca que ficou sem as duas pernas. Mas não se trata de um filme sobre um acidente. O que o roteiro do diretor e de Thomas Bigani com base numa historia do estreante Craig Davison quer ver é o que sentem as figuras expostas, como se dá um recomeço na vida de alguém que perde alguns dos objetivos de vida no campo pessoal e profissional. E para isso se vale da fotografia de Stéphane Fontain, da música de Alexandre Desplat e das locações apresentadas sem a preocupação turística, além do desempenho magistral de Marion Cottilard. Tudo , no entanto, sem deixar os traços de um melodrama que não se furta até de um “happy end”. Para tanto, a narrativa é acadêmica, nunca muito fria ou propositadamente distante do que tende a contar. “Ferrugem e Osso” repousa na reconstrução de suas principais personagens. Uma é reconstituição moral, outra física. As duas pessoas se unem por traumas nessas configurações. Compreende-se isso, ganhando maior dimensão quando Ali supreende o filho mergulhado no mar gelado ao passear de trenó com ele, e no modo como se desespera com o acidente desfazendo a imagem que o mostrou indignado com o menino dizendo que “o odeia”(momento de raiva momentânea, produto de sua dificuldade em se manter sem precisar do auxilio da irmã que, alem dos problemas de família é despedida do emprego de caixa de um mercado). Mesmo tratando de um quadro dramático intenso, Audiard não busca de linguagem introspectiva que afinal se faria sentir dentro dos casos traumatizantes. A vantagem, se é que assim se pode chamar, é que o talento dos interpretes obstrue um melodrama em potencial. Mesmo que o epílogo ceda espaço a um momento afetivo que, a meu ver não pode faltar naquela amalgama dolorosa de duas vidas que sucumbiram e renascem. Ao assistir “Ferrugem e Osso” e avaliar o drama de quem sofreu sérias adversidades contribuindo para a dependencia física e afetiva desses tipos, comparei a outro caso que tive acesso esta semana, da morte em vida de uma familia – mãe e irmãs – que perdeu seu filho e irmãos de forma trágica. Lastimei sinceramente essa situação e lembrei que as familias de Santa Maria (RS) poderiam estar nessa mesma situação, alguns com a morte de todos os filhos. Este parágrafo reflete minha associação entre o filme e o caso real. Marion Cottilard e Mathias Schoenaerts provam seus talentos em personagens difíceis de serem interpretadas no tipo de linguagem que foi explorado pelo diretor. Estiveram entre os premiados merecidamente. (Luzia Álvares)

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