CORALINE ESTUDOU EM HOGWARTS ?
A animação “Coraline” de Henri Selick está nas locadoras longe da prateleira de “infantis”. Procede: quando exibido numa das salas Moviecom no shopping Castanheira, uma senhora mãe saiu soltando fumaça, reclamando que a sua pimpolha abriu no berro em meio à projeção. Mas eu vi o filme agora (não vi no cinema, pois não vejo cópia dublada) e, sinceramente, penso que a menininha chorona não deve ter visto “Branca de Neve e os 7 Anões”. Eu devia ter a idade dela quando estreei minha cinemania no finado Cine Iracema e fugi para ver por trás da cortina, no ambiente claro, aquela bruxa cara de cão, aqueles anões mais feios do que a desgraça e aquelas arvores que pareciam querer agarrar a jovem Branca quando ela foi mandada embora pelo piedoso caçador encarregado de matá-la. Ingmar Bergman, no seu livro de memórias aqui chamado “A Lanterna Mágica”, contou a mesma coisa. Tremeu de medo vendo “Branca de Neve”. E o filme de Walt Disney está entre os clássicos ditos infantis, figurante no cardápio dos bebês de três gerações.
“Coraline” é até moralista. Mãe e pai da menina não davam bola para as necessidades afetivas da filha única. Faziam parte da safra de pais que dizem “deixa pra depois menino chato” quando a criança pede alguma coisa (até informação)em hora que eles estão aperreados com agruras da rotina. Com essa carência a garota, à maneira de Alice (a de Lewis Carrol), descobre um espaço que lhe transporta para um outro “País de Maravilhas”, a réplica de sua casa com pai e mãe afetuosos, fazendo-lhes as graças sem rodeios. O senão desse estágio numa terra que não era de baralho (como na história de Carrol) era o pedido feito pela outra mãe para garota botar dois botões na cara: um de cada olho. Entendam: botão fecha casa de roupa, botão no olho fecha a visão para um espaço que não interessa a quem quer fechar. A menina se rebela, sabe de exemplos terríveis (meninos que morreram sem os olhos e cujos fantasmas perambulam pela casa dos pais postiços), e acaba abraçando papai e mamãe com todos os seus defeitos.
Claro que há do que ter medo. Mas um medo construtivo. A criança só deixa de pegar em fósforo aceso quando lhe queima o dedo. Mostrar que pai e mãe possuem copyright genético é base. Afinal, se a gente nascesse com defeito e valesse prazo de garantia a reclamação iria para os produtores...
Mas eu penso que a garotada medrosa não teme Hogwarts, a escola de bruxos onde estuda Harry Potter. Sei de gente bem miúda que se alistou no fã clube do herói de Joan K. Rowling. Então o que é que há? Talvez o traço do filme animado seja a causa do espanto. O universo de Potter é menos apavorante –apesar de dark. Não sei se no fim da série, quando a porrada com Lorde Valdemort deve surgir pra valer, a coisa continuará como umas férias num terreno onde se pode voar em vassoura. Se for, acredito, os personagens humanos garantirão o fascínio dos mirins. O velho Freud explicaria essa predileção. Como exemplo há o caso da garota inglesa que furou o bloqueio de idade e foi ver no teatro a peça “Equus” em que Daniel Radcliffe, o Harry Potter do cinema, aparece nu. Ela saiu nas nuvens. Efeito que nunca o príncipe beijoqueiro de Branca de Neve conseguiu. (Pedro Veriano_)
quinta-feira, 16 de julho de 2009
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