
Um sujeito alto, loiro, trajando uma jaqueta perolada com um imenso escorpião amarelo às costas. Ele guarda um palito de dente entre os lábios, coloca suas luvas de couro e entra num carro que não tem nada de especial. Sim, nesta história, não são os carros os protagonistas – como na lamentável série Velozes e furiosos ou no bobo 60 Segundos – e sim, o homem. Aquele que tem um talento fora de série ao volante, que cruza as estradas e ruas em velocidade, fazendo peripécias e manobras arriscadas, numa cidade que não dá trégua aos perdedores.
Com roteiro adaptado da obra de James Sallis, Drive é sobre um motorista profissional (Ryan Gosling), que arrisca sua pele trabalhando como dublê em filmes de ação. E, quando ele sai dos sets, arrisca a pele novamente, participando de roubos e operações ilegais. A vida dele não tem muitas perspectivas e ele parece não se importar com nada e com ninguém, inabalável e indiferente como uma pedra de gelo. Até que começa a travar contato com a vizinhança, no ‘cafofo’ aonde mora: conhece a meiga Irene (Carey Mulligan) e seu filho, benício.
“Eu só dirijo”
E sim, ele passa e se importar, amar os dois e ter motivos para esboçar um sorriso. Nas poucas vezes em que abre a boca e emite algum som, Ryan Gosling repete essa frase. Ela serve para ilustrar aquilo que, além de fazer melhor, é a única coisa que o preenche. Vemos a cara de satisfação quando ele acelera, despista a polícia ou bandidos, e olha pelo retrovisor os algozes comendo poeira. Ou quando se vinga colocando toda a fúria no motor e capô do carro, que termina ensanguentado.
Seus planos de vida feliz são frustrados pelo aparecimento do marido dela, que saiu da prisão. Mas quando o motora aceita a proposta do seu ‘rival’ romântico, e dirigir para ele num último trabalho, o tiro sai pela culatra e ele se vê envolto numa grande confusão. E isso implica muito derrame de sangue e abala a relação com o seu chefe manco, da oficina mecânica onde trabalha, que começa a correr risco. Entre muitas cores neons e tons enfumaçados, a Los Angeles de Drive é uma cidade perigosa, e suas ruas são promessas de conflitos para o nosso motorista anti-heroi, que destila sua fúria para salvar aqueles que ama.
Desde o principio, Nicolas Winding Refn impõe uma atmosfera oitentista para homenagear os filmes americanos de ação da época. O letreiro lilás, com uma fonte semelhante a de Dirty Dancing e Gigolô americano, a ambientação composta por roupas e atitudes que são resquícios de Velocidade Máxima, Chuva Negra, Matador de aluguel e Um tira da pesada, pipocam na tela. Mas a inocência ou falta de, estilo visual e narrativo mais, digamos, apurado, desses filmes, ficou para trás.
Drive é um sopro de criatividade, por conta do talento de Winding para expressar visualmente a angustia e a malicia do seu personagem título, em ângulos inusitados, narrativa cadenciada e muita convicção de que está, antes de tudo, lidando com uma história de um homem que se vê numa encruzilhada e tem a sua rotina permeada pela ação. Ele, minuciosamente interpretado por Gosling, é a razão das críticas empolgadas e do sucesso de bilheteria, e é por conta da sua conduta que as perseguições e a violência se tornam mais verdadeiras e autenticas.(Lorenna Montenegro)
Nenhum comentário:
Postar um comentário